DEPOIS DO REST PAUSE : REST IN PEACE

Introdução
Treinos Insanos. Isso me soa tão bem. Adoro escrever sobre treinos e sobre como tornar sua vida mais difícil. É gratificante quando algum aluno se aproxima com os olhinhos iguais ao do gatinho do Shrek e diz – “Betão, a série que você me passou ontem me deixou todo dolorido”. Aqui na academia, essa dor no dia seguinte foi carinhosamente apelidada de dodói anabólico.
Hoje, falaremos sobre como tornar o rest pause ainda mais extremo. Esqueceu o que é rest pause ???
Basicamente, o método tradicional consiste em completar toda uma série com carga máxima, dando rápidos intervalos, de apenas alguns segundos, entre as repetições. Isso é feito com o uso de um peso em que você consiga fazer apenas duas ou três repetições. Depois de chegar na segunda ou terceira, você deverá descansar de 20 a 40 segundos, e tentar outras duas ou três repetições, mais um intervalo rápido, e nova tentativa de duas a três repetições, devendo, no fim da série, ter completado de 8 a 10 repetições no total.”
Explicado e entendido o conceito do rest pause, agora é hora de entender uma nova roupagem para o método e como ela surgiu.



Histórico
Tudo começou quando um frango, digo, aluno desprovido de massa muscular exagerada, veio atrapalhar meu treino. Eu estava fazendo agachamento livre (encostando o glúteo no calcanhar) quando a figura desce as escadas do 1º andar da academia e fica do meu lado esperando que eu terminasse a série. Se vocês soubessem como isso me irrita. Nessa hora, consigo fazer repetições além daquelas que me propus a fazer, só pra deixar o cabra esperando mais tempo.

Assim que guardei a barra no suporte, percebi que era um aluno novo, que havia começado a treinar conosco por aqueles dias. Ele treinava com um fisiculturista conhecido aqui em Guarulhos mas como havia se mudado de residência, a academia em que ele treinava e adorava acabou ficando fora de mão. Resultado : a criatura insatisfeita vivia indagando que na academia dele o pessoal treinava pesado e que ele “não conhecia ninguém que manjasse como o profi dele manjava”.

Bom, aí, não, né ? Puxa o breque de mão porque tem coisas que a mensalidade não vale a pena. Já expulsei e devolvi dinheiro de aluno por bem menos que isso. Preciso da grana da mensalidade ? Claro ! Preciso tratar bem os alunos ? Claro ! Preciso agüentar desaforo de aluno babaca ? Não! Mando embora mesmo e é assim que trabalho aqui. Tínhamos até um mural com a foto do expulso e o porquê da expulsão (hilário, diga-se de passagem) mas depois que minha esposa assumiu a administração, ela achou de bom trato tirar o quadro.

Mas voltando ao fortão em questão. Ele se dirigiu a mim com seu peitinho de pombo cheio de ar, dizendo :
- “Betão, acho seu peck deck muito leve”.
Então, dei a primeira cacetada :
- “Sério, cara ? Da próxima vez que eu for mudar as máquinas de lugar, então, eu te chamo”.
Poxa, eu estava fazendo agachamento, café, guaraná e franol, lombar doendo, som alto tocando e o cara queria que eu fosse simpático ?

- “Acho que você não entendeu, Betão. Eu quis dizer que tem pouca carga. Na academia que eu treinava o peck deck tinha o mesmo número de tijolinhos mas era mais difícil de fazer”.
- “Pode ser porque seu professor não lubrificava a máquina” – respondi.
Vi que a conversa iria desandar pro lado pessoal, então cortei logo o blá, blá, blá ...
- “Mas afinal, o que você quer, camarada ?”
E o pimpolho respondeu : - “Não quero deixar de fazer o peck deck mas quero que você torne o exercício mais difícil, assim como meu antigo professor faria”

Nessa hora, o som da academia estava naqueles momentos de troca de música, sabe ? Silêncio total entre uma música e outra. E o “assim como meu antigo professor faria” acabou ficando em evidência demais. Um aluno antigo escutou e olhou pra mim na hora com cara de assustado. Ele já sabia o que estaria por vir. O novato, não.

E, então, o insatisfeito lançou o desafio. E no meio da minha série de agachamento. Vou tentar ser o mais fiel possível no diálogo que se seguiu, mesmo porque isso aconteceu apenas algumas semanas antes de escrever esse texto.

Betão : - “Então você quer continuar com o peck deck mas acha que a carga máxima da máquina não é o suficiente ?”
Novato : - “Exato”
Minha cabeça começou a trabalhar de forma frenética. O que eu faria para que esse frango se matasse de treinar no peck deck ? Não poderia ser algo simples como drop-sets, série pirâmide, forçada, negativa, etc, pois, provavelmente, o ex-professor super inteligente e dedicado dele já o havia ensinado.

Betão : - “Você já ouviu falar em rest pause ?”
Novato : - “Sim, acho legalzinho. Você vai me passar o rest pause ?. Poxa, pessoal aqui disse que você era fod* e agora você vai me passar esse método que todo mundo conhece ?” – disse ele, com um sorriso sarcástico. Esse tipo de coisa sempre acontece por essas bandas. Pessoal é fanático pelo ex-professor.

Nessas horas que eu agradeço a Deus por não andar armado. Aquele boçal estava mesmo querendo estragar o meu dia.
Betão – “Vamos lá pra cima que eu vou te ensinar alguma coisinha na própria máquina”. Mas eu estava blefando. Não tinha nada de concreto em minha mente.

E minha cabeça não parava de funcionar. O que eu passaria pra esse pseudo projeto de ser humano petulante fazer ? A primeira coisa que veio na minha cabeça foi o rest pause e ele ficou ali me martelando degrau por degrau. Um frio na barriga tomou conta de mim. Fui desafiado e não tinha nada em mente. O que eu faria ? E o rest pause lá, me dizendo pra usá-lo ...
O mala sentou no peck deck, parecia que ele tinha me dado uma surra. Com ar de “eu te venci, Betão, meu professor é melhor que você”. Pensei na hora “Putz, me lasquei inteirinho.”



Então, um lampejo de criatividade se fez presente. Fechei meus olhos por alguns segundos e me lembrei das palavras da Bíblia.

Deus disse: "Faça-se a luz!" E a luz foi feita. Deus viu que a luz era boa, e separou a luz das trevas. Depois Deus percebeu que nas trevas existia uma raça de homens pequenos e os deixou lá, chamando-os de franguinhos malditos das trevas que querem fazer peck deck.

Minha expressão de frustrado se modificou na hora. Respirei fundo e proferi as seguintes palavras.
- “Então, jovem ... você conhece o rest pause, né ? Mas você conhece o REST IN PEACE ?”

O método
Pense em um treino insano. Onde você se sentiu moído no dia seguinte. Grupo muscular treinado pedindo arrego durante o treinamento. Quer sentir isso de novo?
O método REST IN PEACE (R.I.P.) funcionará perfeitamente para exercícios cuja trajetória de execução se pareça com uma semi-círculo, isto é, você poderá utilizar o método para o peck-deck, crucifixo, elevações laterais e frontais, rosca direta e inversa, etc, assim como para exercícios cuja trajetória de execução é uma reta (movimento retilíneo), como leg press, agachamento hack, supino reto, etc.

Aqui, noções de matemática elementares irão te ajudar. E porque ? Porque você irá, primeiramente, dividir a trajetória em partes. Serão partes iguais. Claro que é aproximado, você não precisa riscar o chão com o transferidor ou régua. Vamos pegar a elevação lateral como exemplo.

(1) R.I.P. curvilíneo
Perceba que a trajetória foi dividida em pequenos arcos (parte de uma curva situada entre dois pontos quaisquer da curva.). Por exemplo, arco AB, arco BC e assim por diante. Quanto maior for essa divisão de arcos, mais insano se torna o método. O movimento completo será definido pelos arcos AD (lado direito do “boneco”) e HE (lado esquerdo do “boneco”).
Vamos a um exemplo prático do método. Para ficar mais fácil, utilizaremos apenas os arcos formados pelas letras que vão de A até D (apenas um lado). Claro que você deve fazer para os dois lados. Chamei o método abaixo de R.I.P. crescente.

(a) R.I.P. crescente
Elevação Lateral
- 1 série de 10 repetições de A até D (sim, você começa em cima, pimpolho)
- Descansa 10 segundos em A
- 1 série de 10 repetições de A até C
- Descansa 10 segundos em A
- 1 série de 10 repetições de A até B
- Descansa 10 segundos em A
Nem tente usar o mesmo peso que você usa na série normal. Aliás, não sei se conseguirá usar nem a metade !!!
Essa divisão pode ser feita para o crucifixo ou para o peck deck também (de onde surgiu a idéia inicial). O importante é a divisão dos arcos. Utilizando o método para a rosca direta, fica muito parecido com o nosso velho conhecido “21”. O descanso no ponto A é algo surreal. Os braços começam a tremer, suor fica gelado, a sensação de que o mundo está sendo suspenso por você é gratificante.

(b) R.I.P. decrescente
É o contrário do crescente.
Elevação Lateral
- 1 série de 10 repetições de D até A (começa embaixo)
- Descansa 10 segundos em D
- 1 série de 10 repetições de D até B
- Descansa 10 segundos em D
- 1 série de 10 repetições de D até C
- Descansa 10 segundos em D

(c) R.I.P. particionado
Você pode treinar de forma particionada também. Mas o que seria isso ??
Elevação frontal
- 1 série de 10 repetições de A até B
- Descansa 10 segundos em A
- 1 série de 10 repetições de B até C
- Descansa 10 segundos em B
- 1 série de 10 repetições de C até D
- Descansa 10 segundos em C




(2) R.I.P. retilíneo
Assim como dividimos a trajetória dos movimentos anteriores em arcos, faremos agora em segmentos de reta.


Aqui, continua valendo a mesma divisão do item anterior : R.I.P. crescente, decrescente e particionado, com suas variações na posição de descanso e ordem de execução. A única diferença mesmo é que aqui os movimentos são guiados em cima de uma reta imaginária.

Você pode utilizar o método R.I.P. no último exercício de sua rotina. Por exemplo :

Rotina de ombros I
 - Desenvolvimento pela frente
 - Frontal com barra romana
 - Elevação lateral (R.I.P.)
 - Remada alta
Ou utilizar o método no começo do exercício como se fosse uma pré-exaustão turbinada.

Rotina de ombros II
- Elevação lateral (R.I.P.)
- Desenvolvimento pela frente
 - Frontal com barra romana
- Remada alta

Considerações gerais
Essa nova roupagem do rest pause foi o que me livrou dos comentários exagerados do aluno mala sobre seu professor extraordinário. Acabado o treino, ele me disse que não conseguiria fazer mais nada. Seus ombros, braços e peitoral não respondiam mais à movimentação de forma coordenada. Tudo doía e ele confessou-me que nunca havia treinado daquela forma. Talvez tenha sido demais pra ele, pois 2 semanas depois, não apareceu mais aqui na BetoFlex.

A parte de “descanso”, ou seja, a parte de isotensão é brutal. Continuar com os músculos contraídos é algo que propicia que o sangue continue bombeando o local que estamos trabalhando. O músculo arde, dói, treme ... e isso é o máximo pra quem gosta de treinar pesado.
Espero que vocês, amigos, não me entendam mal. Claro que existem ótimos professores por aí e, apesar de eu conhecer um pouquinho sobre treino não me dá o direito de me achar o bom ou algo do tipo. E não foi esse o caso. Só é extremamente chato ter que ficar ouvindo que fulano ou ciclano é melhor que você porque participou de um campeonato de fisiculturismo de bairro. E, infelizmente, temos muito disso por aqui.

Outro dia, em outra academia de Guarulhos ...
- “Bom dia. Gostaria de fazer a matrícula aqui. Acabei de me mudar pra esse bairro. O professor de musculação daqui é bom ? Porque onde eu treinava, meu ex-professor, o Betão, me ensinou um tipo de treino novo que eu adorei ... blá, blá, blá ...”

E a história volta a se repetir todos os dias em várias academias ...

Stay strong !

Comentários

  1. Apaguei o post de mais um frustrado que se esconde atrás de um teclado em consideração ao pessoal que acessa o blog.
    "Em árvore que não dá fruto não se atira pedra" ...
    Quase 90 mil acessos em menos de 2 meses ...

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  2. Veeeeeeei, que boyzim mais filho de uma pura milher brasileira... Realmente você foi extremamente profissional e não cedeu a babaquice dele! Além da muita falta do que fazer em atrapalhar teu treino né...
    Muito massa o treino que tu bolou (o nome melhor ainda, me lembrou um que criei hehehe). No caso, na divisão de ângulos, a reta A sempre será na maior fase concêntrica dos exercícios, certo? Êta que o trabalho isometrico (pra não dizer isodestruidor) treme até o juízo!

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  3. BETÃO DEPOIS FAZ UM VÍDEO DESSE MÉTODO

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