E aqui estou eu, no ginásio, outra vez...


Foi e ainda está sendo uma grande caminhada. Costumo caminhar com a cabeça baixa, resquício de quando as pessoas no ginásio eram maiores e mais assustadoras que hoje. Saindo do meu carro, já posso ouvir o tilintar dos ferros. Entro no ginásio e ouço a música de fundo, misturada com a música do meu mp3.

A catraca fria, espera uma identificação via polegar. Em outros tempos, mostrei uma carteirinha ou simplesmente assinei um caderno, logo na entrada da recepção. Dizem que é a evolução, novos tempos, onde querem controlar tudo. Mas não vejo muito controle na vida de quem defende essas tecnologias. Enfim ..

Aqui estou eu, de novo, indo em direção ao armário, guardar minha mochila preta da "Risca", companheira de tantos anos. Hoje, ela me pareceu menor, mas igualmente eficaz. Assim como as outras coisas materiais da vida, não tenho muito o que guardar na mochila : uma toalha, garrafa de água, munhequeiras, um cinto velho. A maioria das coisas que tem importância está guardada no coração, ecos de batalhas que me fazem lembrar quem sou ...

O corredor é longo até o armário e até chegar nele, posso ver várias pessoas, com silhuetas de almas diferentes. 

Vi a menina gordinha que não emagrece e agora quer vingança do mundo. Ela te encara como se você fosse o culpado por anos e anos de desrespeito ao próprio corpo. Ela te enxerga como narcisista, egocêntrico e vazio. Duvida que você tenha Faculdade e que possa acertar 3 concordâncias nominais na mesma oração. Ela está profundamente ferida em seus sentimentos e pronta pra atacar. Mas pior que isso tudo é sua cintura deformada, que agride os olhos. Pena é algo que se encaixa nessa situação, mas como já vi esse filme antes e sei que esse sentimento seria recíproco, substituo-o pelo mais infantil "bem-feito" e prossigo minha caminhada.

Também vi o garoto magro, desconfiado, que acha que todos os estão observando, prontos pra rir de suas canelas finas ou camiseta larga. Sei como é. Sei exatamente como é. Não por ter sido magro, mas por ter sido encucado com isso. Faço questão de parar e apertar sua mão. Vejo a surpresa em seus olhos num tom de gratidão e expresso o mesmo. Afinal, quem está ganhando algo aqui sou eu e não ele. Sou grato por ele retribuir o aperto de mão e por me fazer praticar a humildade em um local tão invadido por prepotência.

Mais a frente, uma senhora de uns 60 anos, mais ou menos, passa e me olha por cima dos óculos. Surpreendentemente, ela sorri e solta um "bom dia". Respondo com um sorriso, olho pra trás e a vejo sair pela catraca. Ela carrega uma toalhinha, uma garrafa de água. Só faltou a mochila "Risca". Então, percebo que quero ser assim como ela. Deve ter vivido muita coisa, perdido muita coisa ... mas a gratidão estava estampada em seus olhos e o "bom dia" soou como um pedido. Como se ela tivesse me pedido para que eu tivesse um "bom dia", acontecesse o que acontecesse.

O ginásio já me ensinou muito. A parte humana aqui é de uma diversidade absurda e você pode deslumbrar todos esses nuances 

Nunca vou virar essa página. Há sempre algo pra se ler, se aprender. Não leia assim tão rápido o livro da vida. Existem passagens que são pequenas metáforas, esperando você decifrá-las, entre um treino e outro.

Stay strong !

Betão

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